21 de abr. de 2009

"Foi uma irresponsabilidade cuja culpa eu assumo", disse Wendell Reis perante o juiz

Após o recesso, o delegado Wendell Reis prestou depoimento perante o juiz e o júri. Na ocasião, o juiz fez perguntas ao réu:

Juiz: É verdadeira a acusação de que o senhor matou a vítima Ricardo Seabra?
Réu: Sim, acidentalmente.

Juiz: As provas em relação ao homicídio são verdadeiras?
Réu: Sim, são verdadeiras, eu assumo que matei Ricardo, acidentalmente.

Juiz: O senhor conhecia a vítima fazia quanto tempo?
Réu: Fazia quatro ou cinco anos. Antes do acidente.

Juiz: O senhor tem algo contra alguma testemunha que aqui esteve presente? Ou essas testemunhas têm algo contra o senhor?
Réu: Não. Não tenho nada contra ninguém, conheço todos. Mas, não posso afirmar que elas não tenham nada contra mim.

Juiz: O senhor tem algo contra a família de Ricardo?
Réu: Não, nada. Mas não posso afirmar que eles não tenham nada contra mim.


Nesse momento, Wendell pediu permissão para relatar os fatos:
“Assumi a delegacia de José de Freitas em junho de 2003, juntamente com dois policiais, Marcos Vinícius e Manoel Sales. Quando cheguei lá, procurei estruturar a delegacia, principalmente porque havia necessidades em relação ao armamento. Não tinha arma, então, por segurança a assistente penitenciária Maria do Amparo me emprestou uma arma, revólver calibre 38, cano longo e mais seis balas. Essa arma foi repassada imediatamente aos policiais, que trabalhavam em plantões alternados e transfiram a arma entre si [...]. Como ainda não achava que os policiais estavam seguros, e essa era minha maior preocupação, quando vim à Teresina fui à Gerência de Armas e Munições – GAM – solicitar mais uma arma, pois os policiais estavam trabalhando desarmados. Eles me repassaram apenas a arma, sem munição e disseram ‘Se vire’. Então, tirei as balas da arma emprestada pela Amparo e coloquei nesse outra, que também era um revólver calibre 38. Como a arma era do Estado e a cautela estava no meu nome, pedi para os policiais tomarem mais cuidado, mas a minha preocupação maior era a segurança deles. Sempre que eu saia com as armas, a cautelada, municiada, era colocada embaixo do banco do carro e a desmuniciada, arma particular, entre os dois bancos, próximo ao freio de mão. No dia 05 de setembro, enquanto me dirigia para José de Freitas, estando próximo ao balão do São Cristóvão recebi uma ligação de um vereador, dando informações sobre um homicídio cometido em José de Freitas. Por causa disso eu liguei para a delegacia e avisei que não iria comparecer à cidade porque estava investigando o caso. Mas, ao chegar no 11° DP, onde seria feita a investigação, me deparei com uma paralisação do sindicato [...]. Às 18h, com as duas armas no carro, fui até a casa de uma tia e bebi três ou quatro cervejas em um bar em frente. Por volta das 22h fui para o trailer, a convite do meu irmão. Fui sozinho no meu carro, ele foi em outro com a minha tia Teresa. Havia alguns amigos no trailer, inclusive o proprietário, Daniel. Convidei todo mundo pra boite Side, mas fomos só eu e Daniel. Ao sair do carro, fiz uma coisa que nunca tinha feito, retirei a arma cautelada de debaixo do banco e coloquei na cinta, lembrei dos comentários dos meus amigos sobre roubo de carro e como a arma era cautelada, estava no meu nome. Me identifiquei como policial e entrei na boite. Passamos uma hora lá, até que eu chamei o Daniel para irmos embora, porque eu teria que trabalhar no outro dia em José de Freitas. Ao entrar no carro, através de um gesto rápido e sem consciência, coloquei a arma municiada entre os dois bancos, junto com a desmuniciada e abri a porta para Daniel. Passei no trailer para deixar Daniel quando vi meu outro irmão [...], ia descer para dar um abraço nele. Foi aí que vi também Ricardo, me cumprimentando de longe, nem sequer ouvi a brincadeira que ele fez, apenas queria brincar com ele e peguei a arma, pensando que era a desmuniciada e atirei, gritando ‘Polícia, amigo!’. Quando vi o que tinha feito, fiquei transtornado, ainda gesticulei para o meu irmão, para que ele ajudasse, mas, desnorteado, sai do local do crime e me dirigi à casa do meu pai, no Dirceu. Durante o percurso, sempre que olhava para a arma, pensava em tirar a minha própria vida, então, quando passei pela Ponte Tancredo Neves, joguei a arma pela janela. [...]. Eu disse pro papai ‘pai, atirei num amigo e quero saber como ele está, mas sai do local’, papai pedia calma e dizia que tudo ia dar certo. Eu nunca teria feito isso de propósito, nunca nem neguei o que ocorreu. Não foi por querer, eu não iria estragar minha vida no auge da minha carreira, enquanto tudo estava encaminhado. Se fosse meu irmão ou qualquer outra pessoa próxima teria acontecido também com eles, porque eu sempre fazia essas brincadeiras, sabendo que a arma não tinha munição. Eu sei que a família dele tem raiva de mim, mas eu nunca quis tirar a vida do meu amigo Ricardo [lágrimas]. Foi uma fatalidade. Carregarei essa dor pelo resto da minha vida . Eu peço perdão e clemência à família do Ricardo e repito que nunca quis lhe tirar a vida”.

A promotoria perguntou a Wendell porque ele disse que a arma entregue pela GAM teria sido um 38, se em depoimentos passados ele afirmou que era um revólver Magnun 357. Wendell respondeu que as duas armas são idênticas. “Não sou perito em armas, mas a munição que serve em uma, serve na outra. Só não sei identificar a diferença entre as armas sem analisá-las de fato”.

A promotoria então perguntou se o delegado apertou o gatilho ou a arma disparou sozinha. Ele respondeu: apertei, pensando que não tinha balas. Foi um gesto rápido.

A promotoria indagou ao delegado sobre sua nota nas aulas de armamento e tiro, na academia de polícia. “Passei com 10”, afirmou o réu, que completou que ainda tem porte de arma de fogo, mas nunca mais fez brincadeiras desse tipo com ninguém. Aproveitou para frisar que essa era uma brincadeira comum que ele fazia com todos os amigos próximos e ainda que Ricardo sempre retribuía a brincadeira. “Não tinha motivos para ficar com raiva, mesmo que eu tivesse ouvido a brincadeira, porque era algo natural, sempre brincávamos um com o outro”.

Continuando, Wendell afirmou que não se tratou de um crime passional e insistiu que não teria motivos para assassinar Ricardo. “Não existia motivo, foi irresponsabilidade minha, cuja culpa eu assumo”. Para finalizar, o delegado informou que, por decisão própria durante um acordo, passou a pagar pensão para a viúva e para a mãe de Ricardo. “Pago todo mês, descontado em folha, 30% do meu salário, 15% para a mãe, aplicada de forma vitalícia e 15% para a filha, até que ela complete 24 anos”.